terça-feira, 4 de agosto de 2015

STJ - MANDADO DE SEGURANÇA MS 20336 DF 2013/0239142-7 (STJ)

STJ - Inteiro Teor. MANDADO DE SEGURANÇA: MS 20336 DF 2013/0239142-7

Data de publicação: 01/04/2014
Decisão: . POLICIAL RODOVIÁRIO FEDERAL. DEMISSÃO. UTILIZAÇÃO DE INCIDENTE DE SANIDADE MENTAL INSTAURADO EM OUTRO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR, SEM OPORTUNIZAÇÃO DE CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. NULIDADE CONFIGURADA. SEGURANÇA CONCEDIDA. 1. Trata-se de mandado de segurança atacando ato do Ministro de Estado da Justiça que demitiu o impetrante do cargo de Policial Rodoviário Federal em razão da prática das infrações tipificadas nos arts. 116 , III , 117 , IX e 132 , IV , da Lei 8.112 ⁄1990. 2. Alega o impetrante que o processo administrativo disciplinar que resultou na sua demissão encontra-se eivado de nulidades, uma vez que nele houve utilização de Incidente de Sanidade Mental instaurado em outro processo administrativo disciplinar, sem oportunização de contraditório e ampla defesa; e, ainda, pela ausência de intimação pessoal relativamente aos atos praticados no PAD. 3. Com razão o impetrante, uma vez que não consta dos autos do Incidente de Sanidade Mental notificação para que pudesse exercer o contraditório e ampla defesa, especialmente indicar assistente técnico e apresentar quesitos; e, ademais, a Junta Médica - cujos membros foram identificados sem a indicação de suas áreas de especialidade médica -, concluiu pela sanidade mental do acusado sem apresentar fundamentação apropriada. 4. Segurança concedida para anular o processo administrativo disciplinar a partir da utilização do aludido Incidente de Sanidade Mental e determinar a reintegração do impetrante. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos esses autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da PRIMEIRA SEÇÃO do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento: "A Seção, por unanimidade, concedeu a segurança, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator." Os Srs. Ministros Benedito Gonçalves, Assusete Magalhães, Sérgio Kukina, Ari Pargendler, Napoleão Nunes Maia Filho e Og Fernandes votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausentes, justificadamente, o Sr. Ministro Arnaldo Esteves Lima e, ocasionalmente, o Sr. Ministro Herman Benjamin. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Humberto Martins. Brasília (DF), 26 de março de 2014. MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES , Relator MANDADO DE SEGURANÇA Nº 20.336 - DF (2013⁄0239142-7) RELATOR : MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES IMPETRANTE : ECIVALDO PEREIRA DE OLIVEIRA ADVOGADO : MAXIMIANO JOSE CORREIA MACIEL NETO E OUTRO (S) IMPETRADO : MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA INTERES. : UNIÃO RELATÓRIO O EXMO. SR. MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES (Relator): Trata-se de mandado de segurança impetrado por Ecivaldo Pereira de Oliveira contra ato do Ministro de Estado da Justiça, consistente na Portaria 2.247, de 10⁄06⁄2013, que o demitiu do cargo público de Policial Rodoviário Federal em razão da prática das infrações tipificadas nos arts. 116 , III , 117 , IX e 132 , IV , da Lei 8.112 ⁄1990. Sobre os fatos, o impetrante aduz que é ex-servidor da Polícia Rodoviária Federal, vinculado à 11ª Superintendência Regional da PRF no Estado de Pernambuco, sendo submetido a processo administrativo pela prática de infrações disciplinares consistente na exigência de "vantagem financeira indevida para deixar de praticar ato de ofício durante abordagens, autuações e retenções dos veículos de placas GVI-7893 e GVQ-3188 em 02.07.2007, deixando ainda de registrar no Relatório Operacional Diário essas autuações e retenções, bem como apresentou em serviço sem identificação (nome) no uniforme" (fl. 03-e) . Alega que não cometeu as infrações que lhe foram imputadas e que o processo administrativo disciplinar está eivado de nulidades, diante da "impossibilidade do impetrante acompanhar todos os atos instrutórios do procedimento administrativo disciplinar em face de ter sido portador de doença mental que lhe impedia de perseguir o processo, todavia a Comissão processante não levou em consideração seu estado de doença, uma vez que teria apresentado ao Setor de Recursos Humanos da PRF atestados médicos para licença de tratamento de saúde e afastamento das atividades laborais do período compreendido de 15.06.2011 a 11.06.2013" (fl. 03-e) e que "não mais compareceu aos atos processuais desde 10.05.2011 e mais efetivamente a partir do dia 26.10.2011 (vez que seu patrono não fora convocado pela comissão ou até mesmo pelo próprio acusado), período em que já se encontrava acometido de doença que impossibilitara de trabalhar e exercer qualquer ato advindo do serviço laboral" (fl. 04-e) . Sustenta que os atos de notificação ocorreram de forma irregular, sendo entregues a terceira pessoa, quando deveriam serem entregues única e pessoalmente ao impetrante; e que em razão disso deixou de ser interrogado pela comissão disciplinar, concluindo pela inobservância do devido processo legal e dos princípios do contraditório e da ampla defesa. Destaca que o Incidente de Sanidade Mental não tramitou regularmente, vez que não houve a sua presença, que não houve a regular formação da junta médica, que o corpo de peritos não contava com um médico psiquiatra, que não foi realizada a anamnese e os exames clínicos pertinentes, que as conclusões da comissão de peritos não foi encaminhada à autoridade superior para homologação, que não há laudo pericial a atestar as conclusões dos peritos, que não foram informados os métodos utilizados e exames realizados, além de não ter sido oportunizado prazo para oferecimento de quesitos e indicação de assistente técnico. Ao final, requer seja concedida a segurança a fim de anular o ato coator que resultou na sua demissão do cargo de Policial Rodoviário Federal, bem como a anulação dos atos processuais praticados no processo disciplinar desde à fl. 222, convertendo-a em diligência para solicitar à autoridade a realização de novo incidente de sanidade mental, além da sua reintegração aos quadros da Polícia Rodoviária Federal e a condenação ao pagamento dos salários pretéritos, durante o período em que ficou afastado do serviço. O pedido de liminar foi indeferido. Em informações, a autoridade coatora sustenta a legalidade do ato coator e pugna pela denegação da segurança (e-STJ, fls. 616⁄701), ao fundamento de que existem provas suficientes ao enquadramento nas condutas ilícitas, em especial os documentos e as declarações prestadas pelos motoristas envolvidos na fiscalização e que teriam sido vítimas da tentativa de extorsão pratica pelo impetrante; que o processo disciplinar transcorreu regularmente, inexistindo vícios ou nulidades; que quando o impetrante foi convocado para o interrogatório já havia a junta médica se pronunciado no sentido de que ele estava em condições de comparecer à audiência, sendo que, mesmo intimado por três vezes, não compareceu ao ato, inexistindo cerceamento do direito de defesa, vez que a Lei 8.112 ⁄1990 não condicionou a validade do apuratório ao interrogatório do servidor. Alega ainda que o incidente de insanidade mental não padece de vícios, primeiramente, porque não foi requerido pela comissão disciplinar, mas sim em outro processo disciplinar; que, apesar de estar afastado das atividades funcionais, o impetrante continuava realizando suas atividades sociais, não estando incapacitado para responder ao processo disciplinar, tendo a junta médica concluído pela sua capacidade mental; que a junta médica era composta por três médicos responsáveis pelas perícias e homologações de atestados médicos no âmbito da PRF, inclusive pelo Dr. Ricardo Viana de Barros, Psiquiatra, CRM 7028; que foram obedecidas as formalidades legais; que as respostas da comissão, embora objetivas, atenderam os ditames legais e que é vedado ao Judiciário reavaliar as conclusões do laudo médico. Por fim, destaca a autoridade coatora que foi devidamente observado o devido o processo legal, o contraditório e a ampla defesa, primeiramente porque o impetrante se furtava de receber as intimações, se negando a opor sua assinatura, sob o fundamento de que estaria acometido de doença mental, sendo o PAD desenvolvido com estrita observância das formalidades legais, assegurando-se ao impetrante os direitos constitucionais ao contraditório, à ampla defesa e ao devido processo legal, sendo-lhe devidamente comunicados todos os atos processuais praticados, além de ser-lhe oportunizado o livre acesso aos autos e à produção de provas, vindo inclusive a oferecer defesa, além de que não houve comprovação do prejuízo. A União manifestou seu interesse na causa (e-STJ, fls. 607 e 703). O Ministério Público Federal opinou pela denegação da segurança (e-STJ, fls. 707⁄711). O impetrante formulou pedido de reconsideração da liminar (e-STJ, fls. 714⁄725). É o relatório. MANDADO DE SEGURANÇA Nº 20.336 - DF (2013⁄0239142-7) EMENTA ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. POLICIAL RODOVIÁRIO FEDERAL. DEMISSÃO. UTILIZAÇÃO DE INCIDENTE DE SANIDADE MENTAL INSTAURADO EM OUTRO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR, SEM OPORTUNIZAÇÃO DE CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. NULIDADE CONFIGURADA. SEGURANÇA CONCEDIDA. 1. Trata-se de mandado de segurança atacando ato do Ministro de Estado da Justiça que demitiu o impetrante do cargo de Policial Rodoviário Federal em razão da prática das infrações tipificadas nos arts. 116 , III , 117 , IX e 132 , IV , da Lei 8.112 ⁄1990. 2. Alega o impetrante que o processo administrativo disciplinar que resultou na sua demissão encontra-se eivado de nulidades, uma vez que nele houve utilização de Incidente de Sanidade Mental instaurado em outro processo administrativo disciplinar, sem oportunização de contraditório e ampla defesa; e, ainda, pela ausência de intimação pessoal relativamente aos atos praticados no PAD. 3. Com razão o impetrante, uma vez que não consta dos autos do Incidente de Sanidade Mental notificação para que pudesse exercer o contraditório e ampla defesa, especialmente indicar assistente técnico e apresentar quesitos; e, ademais, a Junta Médica - cujos membros foram identificados sem a indicação de suas áreas de especialidade médica -, concluiu pela sanidade mental do acusado sem apresentar fundamentação apropriada. 4. Segurança concedida para anular o processo administrativo disciplinar a partir da utilização do aludido Incidente de Sanidade Mental e determinar a reintegração do impetrante. VOTO O EXMO. SR. MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES (Relator): A segurança deve ser concedida. O impetrante alega, essencialmente, que houve violação aos princípios do devido processo legal, bem assim aos da segurança jurídica, da legalidade, da ampla defesa e do contraditório (arts. 5º , LIV e LV , da Constituição Federal ), uma vez que no processo administrativo disciplinar que resultou na sua demissão houve aproveitamento de Incidente de Sanidade Mental instaurado em outro processo administrativo disciplinar - a título de prova emprestada -, o qual encontra-se eivado de nulidades. Segundo a inicial, as nulidades no processo administrativo disciplinar que resultou no ato atacado no presente mandado de segurança decorrem dos seguintes fatos: (i) ausência de sobrestamento do processo administrativo disciplinar enquanto não decidido o incidente de insanidade mental; (ii) ausência de oportunização de contraditório ao acusado para que pudesse indicar assistente técnico e apresentar quesitos para acompanhar a perícia; (iii) inexistência de laudo pericial que fundamente as conclusões a que chegaram os membros da Junta Médica; (iv) ausência de posterior encaminhamento do incidente à autoridade instauradora para que se pronunciasse sobre seu regular processamento. De fato, o incidente de insanidade mental em discussão foi instaurado em outro processo administrativo disciplinar. É o que consta do parecer da Consultoria Jurídica do Ministério da Justiça (adotado pela autoridade apontada como coatora), verbis : (...) PRELIMINARES DA DEFESA - DA INÉPCIA DO PROCEDIMENTO ADOTADO NO INCIDENTE DE SANIDADE MENTAL A QUE FOI SUBMETIDO O ACUSADO E SUA CONSEQÜENTE IMPRESTABILIDADE. 24 Às folhas 338⁄341 e 423⁄426, a defesa a alega que "Conforme resta demonstrado dos autos, o ora defendente passou grande parte do período instrutório afastado, sob tratamento de distúrbios psíquicos, havendo, inclusive, atestado médico a documentar esta circunstância de precariedade do seu estado de saúde mental." Acrescenta que "Pairou, portanto, dúvida relevante acerca da sanidade mental do acusado." Descreve ainda que "Em virtude deste fato fez instaurar a 11ª Superintendência da PRF o processo nº 08654005968⁄2011-19, o qual se constitui em incidente de Sanidade Mental do acusado no presente feito. O que se fez atendendo a expediente emanado da própria comissão processante, conforme é possível verificar das fls. 02 do processo apenso." 25 Preliminarmente cabe esclarecer que o processo de incidente de sanidade mental do PRF Ecivaido não foi solicitado por esta Comissão, e sim pelo Presidente da CPAD que apura o processo nº 08.654.005.613⁄2010-31. Dando prosseguimento à análise deste tema, é pacífico que o PRF Ecivaido. apesar de encontrar-se afastado das atividades laborais para tratamento de saúde desde 15 de junho de 2011 prossegue realizando suas atividades sociais normalmente, tais como deslocamento de veículos para outras cidades (Caruaru-PE). Nas ocasiões em que este PRF se encontra em casa, recusa-se a receber a Comissão para efetuar notificações e intimações. conforme constatado nos termos de diligências (fls. 222, 228, 229, 230, 236, 237, 246, 249, 257, 267 a 270, 276, 278, 312 a 316, 318 e 321). Para dirimir qualquer dúvida acerca do estado de saúde do referido PRF, a Comissão que apura o PAD nº 08.654.005.613⁄2010-31, solicitou a autuação do incidente de sanidade nº 08.654.005.968⁄2011-19. A junta médica responsável pela resposta aos quesitos era composta pelos três médicos responsáveis pelas perícias e homologações de todos os atestados médicos apresentados pelos servidores da PRF, sendo um deles, o Dr. Ricardo Viana de Barros, Psiquiatra, CRM 7028, o qual homologou o afastamento PRF Ecivaido de suas atividades laborais, sendo ainda o responsável pelas renovações dos afastamentos deste servidor. Portanto, além de capacidade técnica, o referido médico acompanha a evolução das condições de saúde do PRF Ecivaido por todo o período de afastamento deste. Acrescente-se a referida junta médica, vem trabalhando há vários anos a serviço, do DPRF, por força do convênio nº 1⁄2007, conforme despacho do Chefe da SRH (fí. 06) do processo de incidente de sanidade mental nº 08.654.005.968⁄2011-19, juntado aos autos do presente processo às folhas 283 a 293. (...) (fls. 535⁄536) Por outro lado, verifica-se do incidente de insanidade mental (juntado às fls. 309⁄319-e) que foi determinada a sua instauração pelo Presidente da Comissão Processante (em outro PAD, vale relembrar), ocasião em que foram apresentados quesitos e juntados a título de documentação apenas um laudo médico emitido em data anterior, bem assim um resultado de exame médico-pericial pelo qual fora concedido licença médica ao acusado. A propósito, são os quesitos da Comissão Processante: a) O servidor é portador de doença mental?; b) Qual a espécie nosológica?; c) Tem o servidor desenvolvimento incompleto ou retardado?; d) O servidor por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardamento era, ao tempo dos supostos fatos, ano de 2007, inteiramente incapaz de entender-lhe o caráter criminoso?; e) O servidor encontra-se impossibilitado para acompanhar ou comparecer às audiências?. Em resposta, a Junta Médica limitou-se a responder de forma lacônica aos quesitos apresentados pela Comissão Processante, na forma seguinte: a) Sim; b) CID 10:F 43.0; c) Não; d) Não: e) Não; é capaz de acompanhar e comparecer às audiências (fl. 318-e). De fato, não consta do incidente abertura de contraditório ao acusado para indicar assistente técnico e apresentar quesitos; elaboração de laudo próprio que fundamente as conclusões da perícia; e, ainda, expressa indicação das especialidades médicas dos profissionais que compõem a Junta Médica. Nessas circunstâncias, tem razão o impetrante quando aponta violação aos princípios constitucionais do devido processo legal, com contraditório e ampla defesa, constantes do art. 5º , LIV e LV , da Constituição Federal LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;" ), bem assim do art. 153 da Lei 8.112 ⁄90 ( "O inquérito administrativo obedecerá ao princípio do contraditório, assegurada ao acusado ampla defesa, com a utilização dos meios e recursos admitidos em direito." ).. Ademais, a Lei 8.112 ⁄90 dispõe em seu art. 156 que "É assegurado ao servidor o direito de acompanhar o processo pessoalmente ou por intermédio de procurador, arrolar e reinquirir testemunhas, produzir provas e contraprovas e formular quesitos, quando se tratar de prova pericial " . Ora, trata-se de disposição que deve ser aplicada inclusive no Incidente de Sanidade Mental, a qual supõe exame pericial das condições mentais do acusado. Sinale-se, ainda, que dispõe o art. 160 da Lei 8.112 ⁄90 que a Junta Médica será composta por pelo menos um psiquiatra ( "Art. 160. Quando houver dúvida sobre a sanidade mental do acusado, a comissão proporá à autoridade competente que ele seja submetido a exame por junta médica oficial, da qual participe pelo menos um médico psiquiatra" ); daí a necessidade (não atendida no presente caso) de expressa indicação das áreas de especialidade médica dos membros que a compõem. Em situação análoga, a Terceira Seção concedeu a ordem em julgado assim ementado: MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PERÍCIA MÉDICA. REALIZAÇÃO. INTIMAÇÃO DE ADVOGADO CONSTITUÍDO. INEXISTÊNCIA. PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. VIOLAÇÃO. - A Lei 8.112 ⁄90 reconhece ao acusado em processo administrativo o direito de acompanhar pessoalmente ou por representante os atos do procedimento disciplinar. - Inexistindo, no processo disciplinar, intimação na pessoa do acusado ou na de seu advogado, de perícia médica pertinente à instrução dos autos, o ato torna-se viciado. - O impetrante do mandado de segurança não é obrigado a fazer prova negativa, quando alega como prova a inexistência de ato que deveria existir, sendo igualmente descabida a aplicação do art. 6º , parágrafo único , da Lei 1.533 ⁄51. - Regras sobre a intimação em processo administrativo, constantes da Lei 9.784 ⁄99, que exigem antecedência mínima de 3 (três) dias da realização do ato. - Segurança concedida. (MS 8700⁄DF, Rel. Ministro PAULO MEDINA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 27⁄10⁄2004, DJ 29⁄11⁄2004, p. 221) O voto do Relator foi elaborado nos termos seguintes: Verifico que o writ procura discutir formalidade essencial do processo administrativo disciplinar, mostrando-se, portanto, via adequada, a teor do art. 5º , da Lei 1.533 ⁄51. Cuida-se de apreciar a legalidade da perícia médica requerida por servidor acusado da prática de abandono de emprego, que pretendia, com o exame, demonstrar que sua ausência no serviço não fora intencional, de forma a afastar a incidência do proibitivo legal. Assim, descabe falar-se na importância da presença de acompanhante no exame médico realizado, ou de que a formulação de quesitos não alteraria o Laudo Pericial, pois tais matérias encontram-se afetadas ao mérito do ato administrativo. A questão é formal, e regulada pelo art. 156 , da Lei 8.112 ⁄90 e pelo art. 26 , da Lei 9.784 ⁄99. Transcrevo: Lei 8.112 ⁄90 Art. 156. É assegurado ao servidor o direito de acompanhar o processo pessoalmente ou por intermédio de procurador, arrolar e reinquirir testemunhas, produzir provas e contraprovas e formular quesitos, quando se tratar de prova pericial. Lei 9.784 ⁄99 Art. 26. O órgão competente perante o qual tramita o processo administrativo determinará a intimação do interessado para ciência de decisão ou a efetivação de diligências. § 1 o A intimação deverá conter:I - identificação do intimado e nome do órgão ou entidade administrativa;II - finalidade da intimação;III - data, hora e local em que deve comparecer;IV - se o intimado deve comparecer pessoalmente, ou fazer-se representar;V - informação da continuidade do processo independentemente do seu comparecimento;VI - indicação dos fatos e fundamentos legais pertinentes. § 2 o A intimação observará a antecedência mínima de três dias úteis quanto à data de comparecimento. § 3 o A intimação pode ser efetuada por ciência no processo, por via postal com aviso de recebimento, por telegrama ou outro meio que assegure a certeza da ciência do interessado. (...) § 5 o As intimações serão nulas quando feitas sem observância das prescrições legais, mas o comparecimento do administrado supre sua falta ou irregularidade. Verifico que o Regime Jurídico Único da União garante ao"servidor o direito de acompanhar o processo pessoalmente ou por intermédio de procurador, arrolar e reinquirir testemunhas, produzir provas e contraprovas e formular quesitos, quando se tratar de prova pericial". O dispositivo, que visa dar concretude ao princípio - de resto expressamente adotado pela lei, em seu art. 153 -, exige, à toda evidência, a intimação do interessado ou de seu representante. Em verdade, não é necessário a intimação de ambos. Indispensável que haja intimação de um ou outro. Para que a intimação possa dirigir-se validamente ao causídico, imperativo haver poderes bastantes; entretanto, se o advogado requerer, o ato torna-se obrigatório, a teor dos direitos conferidos pela Lei 8.906 ⁄94 (Estatuto do Advogado). Ademais, a Lei 9.784 ⁄99, que estabelece as regras do processo administrativo no âmbito federal, determina os requisitos das intimações, entre eles a antecedência mínima de três dias, em relação ao ato. Faltando algum elemento imposto pela lei, o ato é nulo. Na hipótese, o impetrante sustenta que "não lhe foi dada oportunidade, embora tivesse advogado constituído nos autos, de indicar assistente técnico para a prova pericial, bem como não intimado das conclusões do perito". Alega, assim, fato que exigiria prova negativa, não se lhe podendo exigir, mesmo em sede de mandamus , que uma tal prova fosse realizada. Assim a jurisprudência: ADMINISTRATIVO - RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA - CONTRIBUIÇÃO SINDICAL. (...) 3. Prova negativa (ausência de autorização) que só poderia ser feita pela autoridade para, desta forma, justificar a supressão. 4. Recurso ordinário provido para conceder a segurança. (ROMS 10991 ⁄ PR ; Ministra ELIANA CALMON; SEGUNDA TURMA; DJ 23.04.2001) Nem há que se falar em necessidade de dilação probatória, pois o ato ausente deveria constar do processo administrativo, cuja cópia encontra-se nos autos. Compulsando os autos, verifico que o Parecer e o Laudo médicos não foram precedidos da inarredável intimação do interessado, nem de seu procurador, o que implica em sua nulidade. Importa, ainda, gizar que descabe aplicar o art. 6º , parágrafo único , da Lei 1.533 ⁄51, que faculta ao impetrante requerer a autoridade exiba documento que encontra-se na posse da Administração, como requisito para que se conceda a seguraça. Seria exigir do autor comportamento contraditório, constrangendo-o a requerer a exibição de documento que alega não existir. Alega a autoridade coatora que o Laudo Pericial não fora contestado. Entretanto, não se cuida da veracidade de seu conteúdo, mas da ausência de formalidade essencial do ato constante do processo administrativo. Mais ainda, de formalidade de ato probatório, intimamente ligado aos princípios do contraditório e da ampla defesa, que restaram violados. Alega,também, que a apenas a Junta Médica poderia intimar o impetrante, não havendo, portanto, falta atribuída à Comissão Disciplinar. O argumento mostra-se irrelevante, pois o mandamus dirige-se contra o Ministro da Saúde, que praticou o ato demissório, não contra o presidente da comissão. Sendo a autoridade coatora superior hierárquico tanto dos membros da comissão quanto da junta médica, e tendo ela referendado o processo administrativo com todos os seus atos, pouco importa qual de seus subordinados praticou a ilegalidade: o ato punitivo final fica igualmente viciado. Em síntese, a falta de intimação para a perícia médica, ato probatório do processo disciplinar, viola os princípios do contraditório e da ampla defesa, bem como as normas que procuram dar-lhe concretude. Posto isso, CONCEDO A SEGURANÇA, para declarar a nulidade do processo administrativo a partir da perícia médica e, por conseguinte, a nulidade do ato demissório. Verifica-se, ademais, que, conforme documentos juntados ao pedido de reconsideração da decisão de indeferimento da liminar, nos autos do Processo Administrativo Disciplinar 08.654.005.613⁄2010-31, no qual está apensado o Incidente de Sanidade Mental de nº 08.654.005.968⁄2011-19 ( o mesmo incidente utilizado no PAD que resultou no ato atacado no presente mandado de segurança ), a Corregedoria da Polícia Rodoviária Federal opinou "pelo retorno dos autos à autoridade instauradora a fim de que a mesma reinstaure o presente processo administrativo disciplinar, redesignando nova comissão processante com vistas a praticar atos a partir da instauração de novo incidente de sanidade mental com a devida intimação do acusado para apresentar quesitos à junta médica se assim lhe convier" (fl. 723-e), uma vez que, além de ter havido nulidades relativas à intimação do acusado, a instauração do incidente de sanidade mental "se deu de forma irregular, não sendo oportunizada ao acusado a oferta de quesitos à junta médica, o que fere mais uma vez os princípios constitucionais do contraditório e ampla defesa, tornando nulo o presente feito" (fls. 722⁄724-e). Embora o parecer acima referido esteja pendente de análise pela Consultoria Jurídica do Ministério da Justiça, seu conteúdo reforça as alegações do impetrante de que foi violado o seu direito líquido e certo de exercer o contraditório no incidente de sanidade mental. Nos termos acima, fica prejudicado o exame das demais alegações trazidas no mandado de segurança. Com essas considerações, CONCEDO A SEGURANÇA para anular o processo administrativo disciplinar nº 08654.005868⁄2007-06 a partir da utilização do aludido Incidente de Sanidade Mental e determinar a reintegração do impetrante ao cargo de Policial Rodoviária Federal (salvo se subsistir pena de demissão decorrente de outro processo administrativo disciplinar), com os efeitos funcionais retroativos à data do afastamento; e efeitos financeiros a partir da data da impetração. Prejudicado o pedido de reconsideração de fls. 714⁄725-e. É como voto. CERTIDÃO DE JULGAMENTO PRIMEIRA SEÇÃO Número Registro: 2013⁄0239142-7 PROCESSO ELETRÔNICO MS 20.336 ⁄ DF Números Origem: 08654005868200706 8654005868200706 PAUTA: 12⁄03⁄2014 JULGADO: 26⁄03⁄2014 Relator Exmo. Sr. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES Presidente da Sessão Exmo. Sr. Ministro HUMBERTO MARTINS Subprocurador-Geral da República Exmo. Sr. Dr. MOACIR GUIMARÃES MORAES FILHO Secretária Bela. Zilda Carolina Véras Ribeiro de Souza AUTUAÇÃO IMPETRANTE : ECIVALDO PEREIRA DE OLIVEIRA ADVOGADO : MAXIMIANO JOSE CORREIA MACIEL NETO E OUTRO (S) IMPETRADO : MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA INTERES. : UNIÃO ASSUNTO: DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO - Servidor Público Civil - Processo Administrativo Disciplinar ou Sindicância - Demissão ou Exoneração SUSTENTAÇÃO ORAL Compareceu à sessão, o Dr. MAXIMIANO JOSE CORREIA MACIEL NETO, pelo impetrante. CERTIDÃO Certifico que a egrégia PRIMEIRA SEÇÃO, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: "A Seção, por unanimidade, concedeu a segurança, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator." Os Srs. Ministros Benedito Gonçalves, Assusete Magalhães, Sérgio Kukina, Ari Pargendler, Napoleão Nunes Maia Filho e Og Fernandes votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausentes, justificadamente, o Sr. Ministro Arnaldo Esteves Lima e, ocasionalmente, o Sr. Ministro Herman Benjamin. Documento: 1302062 Inteiro Teor do Acórdão - DJe: 01/04/2014

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