Instigar
o debate sobre os grandes projetos na Amazônia. Esse foi o objetivo
do o seminário "Reflexões sobre os grandes projetos na
Amazônia: de Belo Monte à Teles Pires-Tapajós. Durante os dias 30
e 31 de maio, sociedade e comunidade acadêmica debatem o tema na
Universidade Federal da Oeste do Pará (UFOPA) que reúne
participantes dos polos Xingu e Tapajós. Na ocasião, foram
apresentadas metodologias de pesquisa, como a da FGV de monitoramento de grandes
projetos analisando os processos de construção de hidrelétricas no
Oeste do Pará.
“Foi
um encontro para debater o desenvolvimento regional e compartilhar as
experiências das hidrelétricas na Amazônia, sendo muito importante
e proveitoso, porque temos que abordar e analisar estes
empreendimentos, refletindo sobre o que eles representam e pensar de
que forma eles podem trazer a melhora efetiva da população”,
ressalta o palestrante Gilberto Marques.
Segundo
o economista e professor, os indicadores sociais de desenvolvimento
humano apontam o sentindo inverso. Tais empreendimentos trazem um
grande investimento no sentido financeiro, com grande impacto
ambiental e com pouquíssima capacidade de gerar indicadores
positivos de desenvolvimento social.
Ainda
segundo Gilberto, assim como Tucuruí e Belo Monte, os projetos de
construção das hidrelétricas no rio Tapajós podem causar impactos
ambientais e sociais irreversíveis até mesmo em Santarém, que está
longe das áreas de implantação mas também sofrerá com os
impactos.
“Afeta
diretamente a população como um todo, não só quem está na área
do empreendimento. Santarém também é afetada, por conta dos
crescimento das demandas e da migração que eles geram, isso causa
impactos. A construção de Belo Monte fez com que a população de
Altamira crescesse em dois anos. Isso impacta diretamente no
orçamento da cidade que precisa de mais saúde e educação e os
governos não dão conta disso. Precisamos refletir esses
empreendimentos não só no presente como também para o futuro”,
conclui Gilberto.
No primeiro plano, D Gracinda. Ao fundo, professor Gilberto
Marques/UFPA, Letícia Ferraro/ FGV e a Dra Andréa Leão, do curso de
Economia da UFOPA. Foto: coordenação do evento.
Dona
Gracinda, os cabelos grisalhos em desalinho evidenciam inúmeras
batalhas contra as violências disparadas pelo Consórcio Norte
Energia, responsável pela construção da hidroelétrica de Belo
Monte, no rio Xingu, sudoeste paraense, entre os municípios de
Altamira e Vitória do Xingu.
Durante
o processo de reassentamento bateu o pé, recusou o valor que a
empresa desejava oferecer pela sua casa. Exigiu também casa para
dois filhos, e que fosse perto da dela. E que o local de moradia não
ficasse longe do centro da cidade. A batalha pessoal é uma das
muitas pelejas em que se envolve a vigorosa senhora que soma 70 anos,
Gracinda Magalhães.
Ela
é uma entre milhares de pessoas que foram expropriadas por conta da
implantação da usina na Volta Grande do Xingu. Entre os dias 30 e
31, Magalhaes foi ponta de lança nas denúncias contra o consórcio
Norte Energia, durante o seminário Grandes Projetos na Amazônia: de
Belo Monte a Teles-Pires-Tapajós, realizado pelos cursos de Gestão
Pública e Desenvolvimento Regional e Ciências Econômicas da
Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA) e a Fundação Getúlio
Vargas (FGV).
A
casa da funcionária pública da área da saúde sucumbiu para ceder
território ao consórcio. Como ela, pescadores, camponeses do
Beiradão (beira de rio), indígenas, extrativistas, oleiros tiveram
suas vidas colocadas de ponta cabeça. “Mas, que a casa, fica
sepultada a nossa história de mais de 30 anos no lugar, nossos laços
de amizade, e um desgaste emocional que tem matado muitos moradores
da região, acometidos por profunda tristeza e depressão” dispara
Magalhães, na noite do dia 31, no auditório da unidade Rondon da
UFOPA.
Gracinda
integrou a mesa de encerramento dedicada ao diálogo com a sociedade
civil sobre Belo Monte e a agenda de grandes projetos para a região
do Baixo Amazonas. Toda ela foi composta por mulheres, onde Maria
Francineide representou o Conselho de Ribeirinhos do Xingu e
Alessandra Karap, o povo mundurucu da região do Tapajós.
Ela
é uma entre milhares de pessoas que foram expropriadas por conta da
implantação da usina na Volta Grande do Xingu. Entre os dias 30 e
31, Magalhaes foi ponta de lança nas denúncias contra o consórcio
Norte Energia, durante o seminário Grandes Projetos na Amazônia: de
Belo Monte a Teles-Pires-Tapajós, realizado pelos cursos de Gestão
Pública e Desenvolvimento Regional e Ciências Econômicas da
Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA) e a Fundação Getúlio
Vargas (FGV).
A
casa da funcionária pública da área da saúde sucumbiu para ceder
território ao consórcio. Como ela, pescadores, camponeses do
Beiradão (beira de rio), indígenas, extrativistas, oleiros tiveram
suas vidas colocadas de ponta cabeça. “Mas, que a casa, fica
sepultada a nossa história de mais de 30 anos no lugar, nossos laços
de amizade, e um desgaste emocional que tem matado muitos moradores
da região, acometidos por profunda tristeza e depressão” dispara
Magalhães, na noite do dia 31, no auditório da unidade Rondon da
UFOPA.
Gracinda
integrou a mesa de encerramento dedicada ao diálogo com a sociedade
civil sobre Belo Monte e a agenda de grandes projetos para a região
do Baixo Amazonas. Toda ela foi composta por mulheres, onde Maria
Francineide representou o Conselho de Ribeirinhos do Xingu e
Alessandra Karap, o povo mundurucu da região do Tapajós.
Da
esquerda para a direita: D. Grancinda, profª Socorro Pena, Maria
Francineide a Alessandra Munduruku. Fotos: organização do evento.
A
mesa, em certa medida, materializa o necessário exercício de
diálogo entre os diferentes saberes que integram a região. Nesta
direção a universidade pública cumpre o seu papel na promoção de
debates com a sociedade, num momento em que vive um ataque constante
do Executivo nacional, marcado por cortes no orçamento, demonização
do conhecimento, aversão à razão e à cultura, e ameaça à sua
autonomia.
Conjuntura
em que as representações dos setores mais retrógrados do Congresso
empreendem desregulamentar as proteções dos territórios ancestrais
e os direitos trabalhistas, e o ministro do meio ambiente fomenta um
desmanche na pasta, com vistas a fragilizar o já delicado processo
de licenciamento ambiental para atender interesses de grandes
corporações de mineração, construção e do agronegócio.
Assim
como Magalhães, a indígena que é estudante do Curso de Direito da
UFOPA, tem sido protagonista na defesa dos territórios dos povos
originários. Por motivo de saúde a representante quilombola do
município de Oriximiná, Claudinete de Souza não pode comparecer. A
professora do curso de Gestão Pública da UFOPA, Socorro Pena,
mediou o debate.
A
discente de Direito, bem como os quase 900 alunos indígenas e
quilombolas da UFOPA possuem a sua permanência ameaçada na
instituição, por conta dos cortes de bolsas que apoiam a
permanência na universidade. A vaquinha na internet tem sido um
expediente usado por alguns discentes para angariar recursos.
Querelas
na Amazônia
O
reassentamento das famílias é considerado como um dos problemas
mais graves embutidos no processo que envolve a implantação de
grandes obras na Amazônia, em particular construção de usinas
hidroelétricas. Mesmo a Comissão Mundial de Barragens, organizada
pelo Banco Mundial, reconhece o problema.
Ainda
hoje, no município de Tucuruí, sudeste do Pará, famílias filiadas
ao Movimento de Atingidos por Barragens (MAB) reivindicam
compensações. A usina foi erguida na década de 1980, no rio
Tocantins, para atender plantas industriais da cadeia de alumínio
nos municípios de São Luís, no Maranhão, da Alcoa, e em
Barcarena, Albrás/Alunorte da norueguesa Norsk Hidro, responsável
por vários crimes ambientais na região.
Belo
Monte
“A
casa que a empresa empurrou a gente é de péssima qualidade. Nem
atar uma rede é possível por conta da estrutura, que não aguenta.
Os reassentamentos não possuem unidade de saúde, árvores,
saneamento básico e nem água. Os carros pipas é que atendem a
população. Alguns reassentamentos ficam bem longe do centro, e as
pessoas não possuem condições para pagar o transporte” denuncia
Magalhães. Ao todo a cidade de Altamira possui cinco
reassentamentos.
O
controle da malária foi o único condicionante que a empresa cumpriu
a contendo. A explicação dada pelos pesquisadores da FGV e pela
representante do conselho de saúde, recai sobre a participação da
sociedade.
Com
relação à questão indígena o painel de especialistas de várias
universidades do Brasil e do mundo, organizado para analisar a
instalação do empreendimento, alertou que a usina representa um
ameaça de genocídio para os povos xinguanos. A desagregação de
aldeias tem sido um dos desdobramentos após a instalação de Belo
Monte. Movidos em acessar recursos do consórcio, o número de
aldeias saltou de 12 antes da construção da hidroelétrica, para 80
nos dias atuais.
Para
a representante do Conselho Ribeirinho do Xingu, Maria Francineide,
Belo Monte é um câncer sem cura, e todos os dias descortina um
problema novo. “A Norte Energia destruiu nossa casa, nossa vida,
nosso rio. Deixou nosso povo doente. Hoje o nosso rio fede. Todos os
nossos direitos não foram respeitados. Muita gente morreu de dor ao
ver a casa ser tombada. Vocês aqui do Tapajós não podem deixar
acontecer aqui, o que fizeram com o Xingu”, realça a ribeirinha.
Maria Francineide, do Conselho de Ribeirinho do Xingu. Foto: organização do evento
Com
relação ao reassentamento, ela destaca que “a Norte Energia só
reconheceu o patriarca ou a matriarca da família, deixando os
agregados de fora, quando a realidade das famílias locais é marcada
por esta característica”. O Conselho Ribeirinho, criado em 2016,
tem organizado rodas de conversas com os atingidos na busca do
retorno aos seus territórios. Para tanto, promoveram ações até em
Brasília.
Baixo
Amazonas
O
governo federal planeja erguer 39 hidroelétricas e 100 pequenas
centrais hidroelétricas na região do Tapajós, alerta Karap ao
iniciar a sua fala. A geração de energia, o modal de transportes
(rodovia, hidrovias e ferrovias), comunicação são os principais
eixos de desenvolvimento definidos do projeto da Iniciativa de
Infraestrutura Regional Sul-americana (IIRSA), onde o Brasil possui
protagonismo.
Tais prioridades possuem rebatimento no Programa
de Aceleração do Crescimento (PAC), onde o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) é o principal
financiador.
O
caso do Baixo Amazonas, os projetos estão descritos no documento
Arco Norte, que visa tornar a região num grande corredor de
exportação de commodities. Soja e minério, em particular. Além do
modal de transporte, usinas de energia, a construção de portos e de
estações de transbordo de grãos integra o cardápio que fere de
morte os territórios dos povos originários.
Planejamento de logística no projeto Arco Norte, que visa dinamizar um corredor de exportação no Baixo Amazonas.
Além
de territórios indígenas e quilombolas, projetos de assentamento da
reforma agrária, a região é tributária de importante mosaico de
unidades de conservação, que soma 33 no total. As áreas de
conservação foram reconhecidas após a execução da missionária
estadunidense Dorothy Stang, em fevereiro de 2005, no município de
Anapu. Como sempre, a ação do Estado tem sido reativa ante as
tragédias que abalam a região.
Em
defesa de seus territórios, a representante mundurucu alerta que a
estratégia de defesa do solo sagrado tem sido a autodemarcação do
território indígena, iniciada no ano de 2015. “Com a colaboração
de pesquisadores da UFOPA e de outras universidades, ficamos dias na
mata fechada, nossos guerreiros e mulheres a demarcar a nossa terra.
O processo ainda não terminou. E sempre enfrentamos as ameaças de
madeireiros e garimpeiros” conta Alessandra, que esteve em Paris
recentemente, denunciando os riscos que pairam sobre a Amazônia.
Alessandra Munduruku. Foto: organização do evento.
Ela
conta que sequer foram recebidos por representantes da empresa EDF,
responsável pela construção de hidroelétricas Teles-Pires, na
fronteira dos estados do Pará e Matogrosso. “Aqui no Brasil o
governo abre as portas. Lá, nem fomos recebidos”, lembra Karap.
Resumo
do seminário
Na
tarde do dia 31 pesquisadores da FGV Leticia Ferraro e Kena Cahves
realizaram oficina sobre monitoramento de desenvolvimento em
territórios que recebem grandes projetos. A fundação dedicou 18
meses no acompanhamento de algumas condicionantes que deveriam ter
sido cumpridas pela Norte Energia.
Além
dos já consagrados problemas que norteiam a instalação de grandes
projetos na região, como a especulação imobiliária, a grilagem de
terras, a migração, o incremento de uso de álcool e drogas,
prostituição e o aumento de gravidez na adolescência, as
pesquisadoras evidenciam o que chamam de epidemia do trânsito. Por
conta de certa dinamização da economia local no boom da obra,
ocorreu o aumento do uso de motos, e por consequência, o aumento de
acidentes, e um certo caos na cidade.
Elas
alertam que além das fontes clássicas de dados, a exemplo do
Datasus, IBGE, Secretaria de Tesouro da União, Instituto Nacional de
Estudos e Educacionais Anísio Teixeira (Inep) é interessante o
diálogo com as secretarias municipais. Como exemplo, citam o caso
registrado no município de Juruti, onde realizaram parceria com a
secretaria de saúde. Na cidade também situada no Baixo Amazonas, a
mineradora Alcoa explora bauxita desde os anos iniciais da década de
2000.
Sandra
Karolline Pontes, egressa do curso de Gestão Pública, e em fase de
conclusão de dissertação no Instituto de Ciências da Sociedade
(ICS) da Ufopa, apresentou parte de sua pesquisa durante a oficina. A
discente vem pesquisando o reassentamento em Altamira desde o TCC.
Sandra Pontes- egressa do Curso de Gestão Pública. Foto: organização do evento