quinta-feira, 30 de março de 2017

Analise de Como Aprendi a Superar Meu Medo e Amar Ariel Sharon

Israelense que fez filme sobre Sharon diz que ação do país contra palestinos mascara fuga à negociação

Documentarista vê surgir uma nova forma de terror
DA REPORTAGEM LOCAL

O documentarista israelense Avi Mograbi, 45, diz que, neste momento, em seu país, é impossível pensar em outra coisa além do conflito com a Palestina. Mas a situação é "emocional demais" para que consiga planejar um filme.
Em entrevista, por telefone, de Tel Aviv, ele fala de "Agosto", seu longa a ser exibido no Brasil, e do anterior, "Como Aprendi a Superar Meu Medo e Amar Ariel Sharon", que classifica como "profético". (SILVANA ARANTES)
Folha - O sr. se arrepende de ter feito "How I Learned to Overcome My Fear and Love Arik Sharon" ("Como Aprendi a Superar Meu Medo e Amar Ariel Sharon")?
Avi Mograbi -
Definitivamente não me sinto mal por ter feito esse filme. É fato que nele o sr. Sharon parece uma pessoa muito amável. Mas essa é precisamente a história do filme -como alguém que parece tão legal e amável pode ser tão horrível. Temos de lembrar o tempo todo quem ele realmente é e não quem ele parece ser.
Não é um documentário sobre Sharon, mas sobre nós, os israelenses. Fiz esse filme em 96. A história é sobre como eu, um cineasta de esquerda, fiz um filme político sobre Sharon, encantei-me por ele, fiquei cativado por seu carisma e mudei minha visão política. Obviamente não mudei de fato minha visão política. Foi uma maneira irônica de colocar as coisas.
Quando terminei o filme, Sharon parecia ser um político em fim de carreira. Cinco anos depois, ele foi eleito primeiro-ministro. O filme acabou sendo um documentário profético, um retrato de como a sociedade israelense esqueceria o que Sharon é, qual é a sua moral, o que fez nos longos anos de sua carreira política, e se renderia ao seu carisma, acreditando que ele poderia lhe dar paz e segurança, como prometia.
Folha - Com que objetivo o sr. filmou "Agosto"?
Mograbi -
Decidi fazer um filme sobre agosto, o mês que mais odeio, pensando que poderia ser uma metáfora sobre a vida em Israel. Quando saí para filmar, não tinha planos. Eu só queria ir às ruas e filmar a violência, porque a atmosfera em Israel nos últimos anos tem sido bastante agressiva e violenta. Minha intenção inicial não funcionou, porque, sempre que você sai à procura de algo, o que busca não acontece onde você está, mas em outro lugar. E não acontece quando você está com a câmera ligada, mas quando você a esqueceu ou está despreparado.
Não encontrei nenhuma violência, mas muitas pessoas reagiram muito agressivamente a mim e à minha câmera. Filmei com uma pequena câmera digital, sozinho. Eu não parecia uma equipe de TV. Mesmo assim, as pessoas não queriam que eu as filmasse, reagiam como se tivessem um sentimento de culpa, algo a esconder.
Não fiz nenhum tipo de provocação. Só falava depois que as pessoas se dirigiam a mim. Mas eu era parte daquilo e me tornei igualmente agressivo. Eu me sinto muito desconfortável nessas partes em que me vejo sendo tão agressivo quanto a rua, mas aconteceu, e eu não poderia esconder. Tampouco queria fazer um filme em que dissesse "eles são maus e agressivos e eu, puro e maravilhoso", porque sou parte deste lugar e provavelmente sou tão agressivo quanto a rua. A questão é: por que somos tão agressivos?
Folha - Tem sido possível trabalhar atualmente em Israel?
Mograbi -
Para os israelenses, a situação está OK. Até há dez dias tínhamos medo de bombas, mas agora a situação está calma, e podemos fazer tudo o que fazíamos antes, embora ainda tenhamos medo em lugares públicos.
Ou seja, nossa vida está razoavelmente normal, mas não podemos pensar em nada além do conflito. Enquanto falo com você [na noite de terça", vejo pela TV um tanque investindo contra uma equipe de jornalistas numa cidade palestina. O que está ocorrendo não é a demolição do terror, mas a criação de uma nova forma de terror. É horripilante.
Folha - Qual é seu novo projeto?
Mograbi -
Ainda não sei. A situação atual oferece muitas idéias, mas tudo é emocional demais agora para realmente pensar em começar um filme. Estou ocupado enviando muitos e-mails, tentando espalhar informações a que não se tem acesso pela imprensa. Tento fazer as pessoas saberem o que está acontecendo. Mais tarde, provavelmente pensarei em algo.
Folha - Que tipo de informações não publicadas pela imprensa o sr. está divulgando?
Mograbi - É muito difícil saber o que está acontecendo nos territórios ocupados, porque o Exército isola o local e não autoriza a entrada da imprensa. Mas há depoimentos devastadores de palestinos sobre o que está ocorrendo lá dentro, sobre quantas pessoas estão sendo mortas, sobre o fato de as ambulâncias não conseguirem recolher mortos e feridos, sobre as atrocidades praticadas pelo Exército e os danos causados a moradias e instituições.
Temos recebido muitas notícias, não pelos meios tradicionais, como jornais e TV, até porque a mídia em Israel tornou-se uma grande propaganda governamental. Não temos como ir lá checar a veracidade de todas as informações, mas, de tempos em tempos, há confirmações de algumas delas e tentamos fazer com que as pessoas saibam e fiquem alertas.
O que está sendo feito [por Israel" não é uma operação limpa, mas uma grande ofensa à população civil. E sua intenção não é necessariamente demolir o terror, mas evitar a negociação.


‘Como Eu Aprendi a Superar Meu Medo e a Amar Ariel Sharon’, de Avi Mograbi, que integrsa a retrospectiva do diretor israelense. Crítico do terrorismo de Estado que o Exército de Israel pratica contra os palestinos, Mograbi me contou na entrevista que fiz para o ‘Caderno 2’ que foi ao encontro de Sharon pensando que ia encontrar um monstro. Enxcontrou um cara caloroso e sedutor, que o fez repensar o filme que queria fazer e o resultado vale a pena conhecer.
 
 

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