Ilhas de história é uma reunião de ensaios de Marshall Sahlins sobre sociedades insulares: Havaí, Fiji e Nova Zelândia. Com erudição e ironia, suas reflexões são uma crítica à história e à antropologia ocidentais, cujo pensamento acadêmico cria falsas dicotomias entre passado e presente, estrutura e história, indivíduo e sociedade.
"O ineditismo da obra de Sahlins se concentra na verificação da riqueza cultural dessas sociedades e na compreensão da transformação criativa elaborada por esses povos, supostamente passivos em sua recepção." Lilia Schwarcz, Estado de S. Paulo
"Sua mensagem central é absolutamente válida: a antropologia está comprometida com a história porque 'cultura é precisamente a organização da situação atual em termos do passado'."J.D.Y. Peel, no Times Higher Education Supplement
"Um trabalho notável, realmente belo." Haunani-Kay Trask, American Ethnologist
Vídeo inicial. Marshall Sahlins: La estructura en coyuntura: - Antropología Social - Educatina.
In: https://www.youtube.com/watch?v=wGZULHrVYsE
In: https://www.youtube.com/watch?v=wGZULHrVYsE
Obra completa. Slide - Ilhas de História – Marshall Sahlins. In: http://doczz.com.br/doc/382/ilhas-de-hist%C3%B3ria-%E2%80%93-marshall-sahlins
Apresentação do autor com audio. In: https://slideplayer.com.br/slide/9184717/
Introdução
p.
07- "A história é ordenada culturalmente de diferentes modos nas
diversas sociedades, de acordo com os esquemas de significação das
coisas. O contrário também é verdadeiro: esquemas culturais são
ordenados historicamente porque, em maior ou menor grau, os
significados são reavaliados quando realizados na prática. (...) as
pessoas organizam seus projetos e dão sentido aos objetos partindo
das compreensões preexistentes da ordem cultural. Nesses termos, a
cultura é historicamente reproduzida na ação."
Texto Base 1 - Fichamento Marshall Sahlins - Ilhas de História. In: https://www.passeidireto.com/arquivo/1918136/fichamento-marshall-sahlins---ilhas-de-historia
Em
sua introdução, Marshall Sahlins trata da relação entre
antropologia e história, e das relações culturais – estrutura,
ação, evento – e suas inter-relações. Na relação entre
antropologia e história, uma ideia que o autor defende incansável e
profundamente é o sentido de que cada cultura tem sua historicidade,
e que cada momento histórico acontece em um contexto cultural
completamente distinto e único.
Começa
falando sobre estrutura, que ele define como “as relações
simbólicas de ordem cultural”. Diz que as estruturas são objetos
históricos, e que a
forma cultural é a junção da estrutura com a ação. Nesse ponto,
defende que existam chances de haver duas ocorrências: a relação
criando a ação, e a ação criando a relação. Diz que em
sociedades cujas relações são construídas através de escolhas
não há menos estrutura do que as sociedades cujas relações são
predeterminadas e imutáveis.
Adiante,
Sahlins define
o evento: “é a relação entre um acontecimento e a estrutura (ou
estruturas)”. Diz que só quando um evento é situado num
esquema cultural é que ele adquire significância histórica. Diz
que não devemos tomar os eventos como proporção um de outro, já
que cada um tem sua importância e valor únicos dentro da cultura e
na história.
Sobre
história, o autor usa frases que definem seu pensamento sobre a
disciplina e suas variantes: “a história é
construída da mesma maneira geral
tanto no interior de uma sociedade quanto
entre sociedades”, “culturas diferentes, historicidades
diferentes”, “os próprios acontecimentos
históricos têm assinaturas culturais distintas”, “a
antropologia tem algo a contribuir para a disciplina histórica. E o
inverso é igualmente válido.”. Se vê, então, que a visão
da história, feita pelo antropólogo, situa a história dentro do
contexto de culturas, e, mesmo dizendo que ela se constrói de uma
maneira geral, é única e acontece em momentos e contextos
culturais igualmente únicos.
p.179- "Parece-me haver algo a mais nessa tempestade num copo de água do
pacífico sul do que apenas uma possivel teoria da história. Há
também uma crítica básica às distinções ocidentais através das
quais geralmente se pensa a cultura, como as supostas oposições
entre história e estrutura ou entre estabilidade e mudança.
Utilizamos constantemente, em nosso folclore nativo assim como em
nossas ciências sociais acadêmicas, essas dicotomias reificadas na
divisão do objeto antropológico. Não será necessário
lembrar-lhes que a antítese entre história e estrutura está
sacramentada na antrologia desde Redcliffe-Brown e o apogeu do
funcionalismo, e foi confirmada mais recentemente pelo estruturalismo
inspirado por Saussure. Porém, aquilo que sugere este breve exemplo
havaiano é que não há base alguma em termos de fenômeno- e,
ainda, alguma vantagem heurística- em considerar a história e a
estrutura como alternativas mutuamente exclusivas. A história
havaiana está, toda ela, baseada na estrutura, na ordenação
sistemática de circunstâncias contingentes, ao mesmo tempo que a
estrutura havaiana provou ser histórica."
p.180- "O que, então, acontece com a oposição corolária entre
estabilidade e mudança? O pensamento ocidental pressupõe, mais uma
vez, que estas sejam antitéticas: contrários lógicos e
ontológicos. Efeitos culturais sáo identificados enquanto contínuos
com o passado, ou descontínuos, como se existissem tipos
alternativos, de realidade fenomenal, em distribuição complementar
em qualquer espaço cultural. Essa distinção atravessa em
profundidade uma série inteira de categorias elementares
organizadoras do saber comum: o estático vs. o dinâmico, ser vs.
devir, estado vs. ação, condição vs. processo e- por que não
incluir?- substantivo em oposição a verbo. A partir desse ponto,
resta apenas um pequeno passo lógico até confundir história com
mudança, como se a persistência da estrutura atrvés do tempo não
fosse histórica. Porém, mais uma vez, a hstória havaiana
certamente nao é única em demonstar que a cultura funciona como uma
síntese de estabilidade e mudança, de passado e presente, de
dacronia e sincronia. Toda mudança prática também é uma
reprodução cultural. Por exemplo, a chefia havaian, enquanto
incorpora identidades e meios materiais estrangeiros, reproduz o
status cósmico de chefe como um ser celestial vindo de kahiki."
p.181- "Toda reprodução da cultura é uma alteração, tanto que, na ação,
as categorias através das quais o mundo atual é orquestrado
assimilam algum novo conteudo epírico. Minha argumentação é que
esse diálogo simbólico da história- diálogo entre as categorias
recebidas e os contextos percebidos, entre o sentido cultural e a
referência prática- coloca em questão uma série inteira de
oposições calcificadas, pelas quais habitualmente compreendemos
ambas a história e a ordem cultural. Não quero dizer apenas
estabilidade e mudança ou estrutura e história, mas o passado
enquanto radicalmente diferente do presente... O problema enfim recai
na relação de conceitos culturais e experiência humana, ou o
problema de referência simbólica: de como conceitos culturais são
utilizados de forma ativa para engajar o mundo. Afinal, aquilo que
está em questão é a existência de estrutras na história e
enquanto história."
p.185-
(...) a cultura é, por sua própria natureza, um objeto
histórico.
p.190- "(...) o caso havaiano já nos mostrou, mesmo com toda a sua
hstoricização dos mundos, que não há base alguma nem razão para
a oposição excludente entre etabilidade e mudança. Todo uso
efetivo das ideias culturais é em parte reprodução das mesmas, mas
qualquer uma dessas referências também é, em parte, uma diferença.
De qualquer jeito, nós já sabiamos disso. As coisas devem preservar
alguma identidade através da mudança ou o mundo seria um hosício.
Saussure articulou o princípio: " aquilo que predomina em toda
mudança é a persistência da substância antiga: a desconsideração
que se tem pelo passado é apenas relativa. É por esta razão que o
princípio da mudança se baseia no princípio da continuidade"
( 1959:74). Mas, em uma certa antropologia e notoriamente no estudo
da história, isolamos algumas alterações e as chamamos de
"eventos", em oposição a "estrutura". (...) o
significado de qualquer forma cultural específica consiste em seus
usos particulares na comunidade como um todo."
p.191- "(...) um evento não é somente um acontecimento no mundo, é a
relação entre um acontecimento e um dado sistema simbólico. E
apesar de um evento enquanto acontecimento ter propriedades
"objetivas" próprias e razões procedentes de outros
mundos, não são essas propriedades, enquanto tais, que lhe dão
efeito, mas a sua significância, de forma que é projetada a partir
de algum esquema cultural. (...) os eventos não podem ser entendidos
separados dos seus valores correspondentes: é a significância que
transforma um simples acontecimento em uma conjuntura fatal."
p.192- "Os erros antropológicos ( ou históricos) gêmeos, o materialismo e
o idealismo, consistem claramente em tentativas de ligar uma
significância prenhe de sentido a uma relação mecânica ou
"fisicalista" de causa e efeito. Para o materialismo, a
significância é efeito direto das propriedades objetivas do
acontecimento. Ignorando, portanto, o valor relativo do sentido dado
pela sociedade ao acontecimento. Enquanto que, para o idealismo, o
acontecimento é simplesmente o efeito de sua significância,
ignorando assim, sua carga de "realidade": as forças que
tem efeitos reais, mesmo que sempre em termos de algum esquema
cultural."
O
mesmo é válido para a teoria e a prática, se as tomarmos como
alternativas de natureza de fenômeno: essa distinção objetivada
entre conceitos culturais e atividades práticas é falsa na prática
e absurda na teoria. Toda práxis é teórica. Tem sempre início nos
conceitos dos atores e nos objetos de sua existência, nas
segmentações culturais e nos valores de um sistema a priori.
Portanto, não ha materialismo algum que não seja histórico. Marx
já o dissera, mas um certo marxismo contemporâneo e de modismo,
confuso pela oposição entre teoria e prática, nega esses fatos.
Considerem a afirmação feita por Hindes e Hirst:
Os
eventos históricos não existem [em] e não podem ter efetividade
material alguma no presente. As condições de existência das
relações sociais atuais existem necessariamente são reproduzidas
constantemente no presente. Não foi ao "presente" que o
passado se dignou a nos das acesso, mas sim à "situação
atual"... Toda teoria marxista, por mais abstrata que seja,
existe para tornar possível a análise da situação atual. Uma
análise histórica da "situação atual" é impossível. (
Hindes e Hirst, 1975:312).
No
entanto, a cultura é justamente a organização da situação atual
em termos do passado.
Texto base 2: Resenha de "Ilhas de História" de Marshall Sahlins. In: http://sociologiaeantropologia.blogspot.com/2012/04/normal-0-21-false-false-false_17.html
No
capítulo cinco do livro, História e Cultura, o autor retoma a
história do encontro do Capitão Cook com o povo havaiano e todas as
relações envolvidas nesse contato.
Sahlins
pretende resgatar, para a análise cultural, acontecimento, ação,
transformação; e inversamente, resgatar para a história, a análise
estrutural. Para ele, a palavra estrutura remete a categorias
culturais concebidas como uma rede conceitual: um sistema de
diferenças e um conjunto de categorias.
Com
a chegada dos barcos ingleses a ilha, instalou-se um intercâmbio
satisfatório entre os moradores locais e a tripulação do capitão
Cook. É importante ressaltar que nessas trocas, os objetivos eram
bem distintos. Como na realidade local o princípio mais importante
era a hierarquia existente; é exatamente através dessas trocas que
as mulheres buscavam uma mobilidade social dentro daquela estrutura.
Fato que se concretizava quando elas mantinham relações sexuais com
os tripulantes ingleses que, de acordo com a tradição havaiana,
eram de natureza divina. Nesse momento, podemos fazer um link com o
texto de Lynn Hunt, pois segundo o autor, no momento em que o capitão
Cook chega à ilha ele é classificado como uma forma histórica
dentro da realidade mítica local. Representando Lono, o deus da
fertilidade, o capitão Cook ocupa um lugar na estrutura existente, a
isto o autor chama de signo de posição. Cook já era uma tradição
para os havaianos antes mesmo de se tornar um fato.
Já
no exemplo das relações sexuais entre os tripulantes e as mulheres
locais, ocorre um signo em ação: categorias e valores mobilizados
de acordo com a situação. Nesse exemplo ocorre uma mudança na
estrutura da sociedade. As mulheres que ocupavam categorias
subalternas dentro da estrutura local passam a reivindicar seu status
de geradoras de filhos de Deuses. Os signos transformam o significado
original.
Na
continuação da história, um incidente meteorológico fez com que o
barco do capitão Cook se afastasse da ilha durante uma manobra e ao
retornar para as proximidades da ilha, o tratamento recebido se
transformou completamente. A receptividade encontrada anteriormente
fora substituída pela violência e autoridade do chefe maior da
tribo, fato que culminou na morte do capitão Cook. Esse incidente
resume bem a relação existente entre estrutura e evento. Segundo
Hunt, a transformação de uma cultura também é um modo de
reprodução dessa cultura. As relações desenvolvidas entre os
moradores da ilha e os tripulantes europeus iniciaram uma oposição
entre os chefes locais e o povo, o que não estava previsto nas
relações tradicionais. Ocorre uma transformação na estrutura
local. A estrutura dominante inicial que os chefes distinguiam-se do
povo assim como os europeus eram diferentes dos havaianos foi
abolida. O contato histórico com os europeus submeteu a relação
entre os chefes e o povo a tensões inexistentes e a nova formação
de classes passou a desconsiderar os elos de parentesco.
Para
Sahlins estrutura e evento estão inseparavelmente ligados, e na
medida em que acontecimentos são signos, a história pode ser
organizada por estruturas de significado. Como a história transforma
essa ordem e de que modo a própria história é ordenada no processo
é uma micro investigação densamente argumentada pelos temas de
reprodução e transformação dados por Sahlins.
Segundo
Sahlins, os elementos dinâmicos em ação estão presentes em todos
os aspectos da experiência humana. Dessa maneira, “Ilhas de
História” oferece novas oportunidades de suavizar o materialismo
através de perspectivas culturalistas e de fortalecer a abordagem
simbólica através da atenção às dificuldades da vida.
A
transformação na qual o livro de Sahlins se concentra deriva das
perturbações de classe e inovações que Sahlins chama de relações
históricas que ao mesmo tempo reproduzem as categorias culturais
tradicionais e atribuem-lhes novos valores a partir do contexto
usual. Toda transformação estrutural implica reprodução
estrutural.
Vídeos
Marshall Sahlins e Hip Hop, Big Mac e Angu do Gomes. In: https://www.youtube.com/watch?v=_S7eb4xzn94&t=110s
Marshall Sahlins y los tipos de reciprocidad - Antropología Social - Educatina. In: https://www.youtube.com/watch?v=Pan160lYlyE
Marshall Sahlins y la sociedad opulenta primitiva - Antropología Social - Educatina. In: https://www.youtube.com/watch?v=LHLRLZZQL5g
Antropologia e a História Diálogos. In: https://www.youtube.com/watch?v=TNfOaF9be5A
História: História e Antropologia - Lilia Schwarcz - PGM 15 In: https://www.youtube.com/watch?v=r1HVy9XHxw0
Marshall Sahlins na UNICAMP 2007 - parte 1
Marshall Sahlins: Anthropology
Terra Plana - Captain James Cook (1728 - 1779). In: https://www.youtube.com/watch?v=KN3zFVxegDU
Os Viajantes: Capitão Cook. In: https://www.youtube.com/watch?v=ITccfPSqsNI&t=35s
James Cook Grandes Navegadores. In: https://www.youtube.com/watch?v=4YAZNEvSXNY
Havaí - Traços Culturais. In: https://www.youtube.com/watch?v=5Fw5ibat05Y
Cultura no Havaí: música, dança e luau! In: https://www.youtube.com/watch?v=SpngLW0lNxY&t=14s
Hawaii - Cultura e Curiosidades. In: https://www.youtube.com/watch?v=_-FXRbJhUq0
O Mundo Segundo Os Brasileiros - Havaí EUA HD Completo. In: https://www.youtube.com/watch?v=B7oYcH5VpIk
Kelly Slater - O rei do Surf, rei do Havaí. Quem é Kelly?! Kelly é deus!
In: https://www.youtube.com/watch?v=0_cg5MDMKIM
Kelly Slater - Entrevista Esporte Espetacular. In: https://www.youtube.com/watch?v=gF-ubjTbs8Q
Parte 1
Parte 2
Moana: um mar de aventuras. In: https://www.youtube.com/watch?v=oY1CDuiMJZQ
Referências
SAHLINS,
Marshall. Introdução. In: _____. Ilhas de
História. Rio de Janeiro: Zahar
Editores, 2004.
Estrutura
e História
SAHLINS, Marshall. (1997) [1985]. “Introdução” e “Suplemento
à viagem de Cook; ou le calcul sauvage”. Em: Ilhas
de História.
Rio de Janeiro: Editora Jorge Zahar. pp. 7-51.
SAHLINS,
Marshall. (1997) [1985]. “Estrutura e história”. Em: Ilhas
de História.
Rio de Janeiro: Editora Jorge Zahar. pp. 172-194.
10ª
aula 8/11 1ª prova
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